Total de visualizações de página

domingo, 19 de agosto de 2012

SAUDADE

Saudade é uma das palavras mais presentes na poesia de amor da língua portuguesa e também na música popular, "saudade", só conhecida em galego e português, descreve a mistura dos sentimentos de perda, distância e amor. 

A palavra vem do latim "solitas, solitatis" (solidão), na forma arcaica de "soedade, soidade e suidade" e sob influência de "saúde" e "saudar".


Diz a lenda que foi cunhada na época dos Descobrimentos e no Brasil colónia esteve muito presente para definir a solidão dos portugueses numa terra estranha, longe de entes queridos.

Define, pois, a melancolia causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, coisas, estados ou ações. Provém do latim "solitáte", solidão.

Uma visão mais especifista aponta que o termo saudade advém de solitude e saudar, onde quem sofre é o que fica à esperar o retorno de quem partiu, e não o indivíduo que se foi, o qual nutriria nostalgia. A génese do vocábulo está directamente ligada à tradição marítima lusitana.

A origem etimológica das formas atuais "solidão", mais corrente e "solitude", forma poética, é o latim "solitudine" declinação de "solitudo, solitudinis", qualidade de "solus". Já os vocábulos "saúde, saudar, saudação, salutar, saludar" proveem da família "salute, salutatione, salutare", por vezes, dependendo do contexto, sinônimos de "salvar, salva, salvação" oriundos de "salvare, salvatione".

O que houve na formação do termo "saudade" foi uma interfluência entre a força do estado de estar só, sentir-se solitário, oriundo de "solitarius" que por sua vez advém de "solitas, solitatis", possuidora da forma declinada "solitate" e suas variações luso-arcaicas como suidade e a associação com o ato de receber e acalentar este sentimento, traduzidas com os termos oriundos de "salute e salutare", que na transição do latim para o português sofrem o fenómeno chamado síncope, onde se perde a letra interna l, simplesmente abandonada enquanto o t não desaparece, mas passa a ser sonorizado como um d. E no caso das formas verbais existe a apócope do e final.

O termo saudade acabou por gerar derivados como a qualidade "saudosismo" e seu adjetivo "saudosista", apegado à ideias, usos, costumes passados, ou até mesmo aos princípios de um regime decaído, e o termo adjetivo de forte carga semântica emocional "saudoso", que é aquele que produz saudades, podendo ser utilizado para entes falecidos ou até mesmo substantivos abstratos como em "os saudosos tempos da mocidade", ou ainda, não referente ao produtor, mas aquele que as sente, que dá mostras de saudades.

Alguns poemas....


SAUDADE

Saudade - O que será... não sei... procurei sabê-lo
em dicionários antigos e poeirentos
e noutros livros onde não achei o sentido
desta doce palavra de perfis ambíguos.

Dizem que azuis são as montanhas como ela,
que nela se obscurecem os amores longínquos,
e um bom e nobre amigo meu (e das estrelas)
a nomeia num tremor de cabelos e mãos.

Hoje em Eça de Queiroz sem cuidar a descubro,
seu segredo se evade, sua doçura me obceca
como uma mariposa de estranho e fino corpo
sempre longe - tão longe! - de minhas redes tranquilas.

Saudade... Oiça, vizinho, sabe o significado
desta palavra branca que se evade como um peixe?
Não... e me treme na boca seu tremor delicado...
Saudade...

Pablo Neruda



:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
SAUDADE
Tu és o cálix;
Eu, o orvalho!
Se me não vales,
Eu o que valho?

Eu se em ti caio
E me acolheste
Torno-me um raio
De luz celeste!

Tu és o collo
Onde me embalo,
E acho consolo,
Mimo e regalo:

A folha curva
Que se aljofara,
Não d'agoa turva,
Mas d'agoa clara!

Quando me passa
Essa existencia,
Que é toda graça,
Toda innocencia,

Além da raia
D'este horizonte—
Sem uma faia,
Sem uma fonte;

O passarinho
Não se consome
Mais no seu ninho
De frio e fome,

Se ella se ausenta,
A boa amiga,
Ah! que o sustenta
E que o abriga!

Sinto umas magoas
Que se confundem
Com as que as agoas
Do mar infundem!

E quem um dia
Passou os mares
É que avalia
Esses pezares!

Só quem lá anda
Sem achar onde
Sequer expanda
A dôr que esconde;

Longe do berço,
Morrendo á mingoa,
Paiz diverso...
Diversa lingoa...

Esse é que sabe
O meu tormento,
Mal se me acabe
Aquelle alento!

Ah, nuvem branca
Ah, nuvem d'oiro!
Ninguem me estanca
Amargo choro;

E assim que passes
Mesmo de largo...
Vê n'estas faces
Se ha pranto amargo.

Tu és o norte
Que me desvias
De ir dar á morte
Todos os dias;

A larga fita
Que d'alto monte
Cerca e limita
O horizonte!

Tu és a praia
Que eu sollicito!
Tu és a raia
D'este infinito!

Se ha uma gruta
Onde me esconda
Á força bruta
Que traz a onda;

Á força immensa
D'esta corrente
D'alma que pensa,
Alma que sente;

Se ha uma véla,
Se ha uma aragem,
Se ha uma estrella,
N'esta viagem...

É quem eu amo,
A quem adoro!
E por quem chamo!
E por quem choro! 

João de Deus, in 'Ramo de Flores'

Nenhum comentário:

Postar um comentário